AS CRIANÇAS DEVEM DORMIR COM OS PAIS? A ETERNA QUESTÃO

Com toda a certeza que todos os pais já se depararam com esta questão que não tem uma resposta simples e linear. Assim, este mês, partilhamos um interessante artigo do Diário de Notícias sobre o tema.
Quase metade dos filhos vai para a cama dos pais, dizem estudos. Os especialistas dividem-se. Passar a noite no quarto dos progenitores torna os mais novos dependentes e com baixa auto-estima, alertam alguns pedopsiquiatras. Outros vêem neste hábito uma boa forma de os acalmar e transmitir segurança
Em casa dos Nunes vivem quatro pessoas, mas dos dois quartos apenas um é usado. O bebé Diogo, com cinco meses, dorme no berço junto à cama de casal e Mariana, de 2 anos, dorme no meio dos pais. "Quando a colocava no berço chorava e, como lhe dava de mamar muitas vezes por noite, comecei a deitá--la na nossa cama. Foi ficando, até hoje", conta a mãe, Tânia, de 27 anos.
Em Portugal não há dados sobre o número de famílias que optam por dormir com os filhos, mas um Estudo Nacional sobre a Posição para Dormir na Infância, de 2003, conduzido pelo Instituto de Saúde dos EUA, concluiu que 45% das crianças passavam pelo menos parte da noite na cama dos pais.
O tema, frequentemente conhecido por co-sleeping, é polémico e continua a dividir pediatras e psicólogos portugueses. Alguns são radicalmente contra, outros apenas toleram que a criança fique com os pais até ao meio ano de idade. Há ainda quem aconselhe a partilha da cama como forma de acalmar os filhos.
É o caso da médica de família Celina Pires, autora do primeiro site português sobre amamentação. "Cabe a cada família a decisão de dormir ou não com a criança, mas torna-se mais fácil para a mãe conciliar os despertares nocturnos para dar de mamar". Um costume, diz, que pode ser sinónimo de conforto e repouso. "Estudos sobre o sono demonstram que as mães que partilham a cama com os seus bebés têm um sono mais longo e reparador."
Ter de amamentar o Matias, de 18 meses, duas vezes por noite, também levou Celine Rodrigues, de 28 anos, a colocar o filho a dormir a seu lado: "Ainda cheguei a adormecê-lo no outro quarto, mas era um incómodo quando, durante a noite, tinha de me levantar para lhe dar de mamar. Este contacto físico enriquece muito a nossa relação."
A pediatra Paula Pires de Matos diz que "a maioria dos pais colocam as crianças na sua cama para poderem dormir à noite descansados, pois têm de trabalhar no dia seguinte". Outros, explica, "fazem-no pois acham que é a forma mais correcta de os educar". Os pais podem fazer essa opção, desde que salvaguardem a segurança do bebé, diz.
Já a pedopsiquiatra Raquel Lima defende que não há justificação para a criança passar a noite na cama dos pais, pelo menos depois dos seis meses. "É uma questão de higiene física e mental", diz a especialista, acrescentando: "São vistas com o vulneráveis e que podem ficar traumatizadas na sua autonomização, que é, porém, fundamental para o seu desenvolvimento."
Mais radical, o pediatra Libério Ribeiro defende que o bebé deve dormir no seu espaço desde o nascimento, sobretudo pelo risco de morte súbita (ver texto em baixo). "Nos primeiros tempos écompreensível que durma no berço junto dos pais, mas depois dos nove meses deve mudar de quarto." Até porque o hábito de dormir com os pais traz consequências: "São habitualmente crianças super protegidas, que se tornam dependentes, com dificuldade em lidar com problemas básicos, têm baixa auto estima e toleram mal a frustração", sublinha Raquel Lima. Celine não concorda e diz que Mateus "é uma criança independente e super sociável".
O pediatra Gomes Pedro acrescenta que os casos de co-sleeping acontecem sobretudo nas famílias monoparentais, em que o pai ou a mãe procuram no filho o complemento de afectividade perdido. É assim em casa de Rui Mendonça. Desde que se divorciou procura adormecer Francisca, de 4 anos, na cama dela, mas sabe que não aguentará toda a noite. "Parece que tem um despertador. Por volta das 3.00 da manhã aparece no meu quarto. Aconchega-se e acaba por dormir agarrada a mim."
O hábito enraíza-se na família, dizem os médicos, e torna-se difícil de perder. Ao consultório de Raquel Lima chegam frequentemente casos destes e já numa fase bastante avançada: "Muitas vezes só pedem ajuda quando a criança está a entrar na puberdade, com 10 e 11 anos, e os pais não podem mais negar a realidade." A maioria dos casos torna-se num verdadeiro problema. "Os pais arrastam a situação e cedem porque a criança chora e faz birra. Ela olha para a situação como um direito garantido e acaba por impor a sua vontade", diz o psicoterapeuta Eduardo Sá, para quem a autonomia é fundamental a partir dos quatro meses.
Para Gomes Pedro a desabituação de dormir com os pais deve ser um processo lento e progressivo, aproveitando uma viagem, por exemplo. Já para Libério Ribeiro, o desmame tem de ser drástico: "A criança chora um ou dois dias, mas acaba por se adaptar. É preciso haver determinação e não ceder."